A psicologia em Gilmore Girls: café, amor e muitos problemas
Equipe Eurekka
If you are out on the road… Se você sabe completar a música da abertura, então este texto sobre a psicologia em Gilmore Girls é para você!
Que Lorelai, Rory e Emily são mulheres icônicas nós não temos dúvidas, certo? Porém, depois de assistir a série mais de uma vez, alguns problemas bem estranhos começaram a saltar aos olhos.
Afinal, será que Rory Gilmore não era tão perfeita assim? E será que Lorelai é sempre uma mulher bem resolvida que lida da melhor forma com as situações?
É isso que vamos jogar na mesa no texto de hoje, boa leitura!
Índice
Por que a série Gilmore Girls é tão famosa?
Lançada no ano 2000 e dirigida por Amy Sherman-Palladino, Gilmore Girls tem todos os detalhes para ser uma série conforto: referências à cultura pop, lugares aconchegantes, piadas internas, personagens inesquecíveis e uma cidadezinha tão charmosa que dá vontade de mudar para lá.
Além disso, não podemos deixar de lado o toque de nostalgia ao reviver o universo dessa época, como as fitas cassetes, as locadoras e as lojas de CDs, tão populares naqueles anos.
Isso tudo, juntando com uma história adorável e uma escolha de atores impecável, foi a receita do sucesso para que a série não fosse esquecida e continuasse famosa até os dias de hoje.
A psicologia em Gilmore Girls: as mulheres Gilmore
Ao longo da trama, acompanhamos a trajetória de Lorelai, Rory e Emily, as três gerações de mulheres da família Gilmore. Cada uma delas com uma história e personalidade própria, enfrentando seus próprios dilemas e dificuldades.
E, neste tópico, iremos fazer uma pequena reflexão sobre cada uma delas. E, logo após, iremos entrar em uma análise de pontos específicos da história.
Confira!
Emily
Inicialmente, Emily aparece como a típica mãe rica e narcisista. Ela entra de novo na vida das meninas quando Lorelai precisa de ajuda para pagar pela escola de Rory, Chilton.
Porém, apesar de durante toda a série ela despertar a ira de Lorelai — e a nossa — com suas ações controladoras e julgadoras, também nos é apresentado o outro lado de Emily.
Com Richard sempre trabalhando e com a ausência da filha e da neta, ela se sente muito sozinha, preenchendo sua vida com aquilo que conhece: os eventos da alta sociedade.
Além disso, também podemos ver que ela passava por dificuldades com a família do Richard, que a reprovava muito. E quando descobrimos isso, entendemos mais essa face de Emily que também tem a necessidade de provar que é boa o suficiente.
Lorelai
Filha de Emily e Richard Gilmore, Lorelai nasceu em um berço de ouro, com todas as boas oportunidades que a vida poderia oferecer.
Porém, com um forte desinteresse pelos costumes burgueses e uma ironia inata, ela sempre foi o contrário do que os pais esperavam.
Sendo que essa relação se torna ainda mais complicada quando Lorelai engravida na adolescência e se recusa a se casar com Christopher, seu namorado na época. E, não apenas isso, ela foge de casa para ter o bebê sozinha e construir sua própria vida.
E toda essa situação fez com que ela criasse não só um senso de independência muito forte, mas também uma vida distante de tudo aquilo que seus pais representavam.
Assim, na personagem de Lorelai, podemos ver o modo como a relação parental interfere muito no nosso senso de identidade, nos revelando aquilo que somos, mas também aquilo que não queremos ser.
Além disso, com sua trajetória podemos ver como a estrutura familiar deixa marcas em nós. Lorelai odiaria admitir, mas nós vemos muitas marcas de Emily e Richard em suas ações.
Como, por exemplo, o seu ímpeto de conseguir o que quer, tão característico da mãe e até o modo como elas passam creme facial da mesma forma antes de dormir. E sem contar a sua aptidão para negócios, tal qual o pai.
Rory
Rory é apresentada na série como uma menina estudiosa, leitora voraz e muito querida por todos em Stars Hollow.
Ao mesmo tempo em que ela é muito parecida com Lorelai no gosto para filmes, comidas favoritas, humor duvidoso e vício em café, ela também se mostra muito diferente com sua organização, foco nos estudos e planejamento.
A relação maternal das duas é, propositalmente, bem diferente da que Lorelai tinha com Emily, sendo que as duas se portam muito mais como amigas. Ainda mais por Lorelai ser bem jovem e ter uma visão mais moderna da vida.
E o interessante (e meio desastroso) é que vemos a ascensão e queda de Rory Gilmore ao longo das temporadas.
Se no início ela é uma garota inteligente, frequentando a melhor escola e uma das melhores faculdades, com o tempo ela começa a perder o controle e tomar atitudes bem questionáveis.
Assim, vemos uma desconstrução da perfeição de Rory, além de também acompanharmos as vidas paralelas de seus casos românticos: Dean, Jess e Logan. E o interessante é que cada um deles reflete uma fase da vida de Rory.
Dean é o primeiro amor, inocente e perfeito no início, enquanto Jess é o romance avassalador e perigoso da adolescência. E Logan é a fase em que Rory começa a entrar na vida adulta, sendo que ele representa um mundo muito mais parecido com o de Christopher do que com o de Lorelai.
Problemas que a psicologia mostra em Gilmore Girls
Até aqui já deu o que falar né?
Mas ainda tem mais detalhes que só fui perceber depois de assistir várias vezes, veja se você também teve a mesma percepção!
O problema das expectativas familiares
A nossa família sempre coloca expectativas em nós, é inevitável e totalmente normal. Isso porque todos no mundo esperam por algo e, sendo o vínculo familiar algo muito forte e próximo, essas expectativas acabam sendo mais evidentes.
O problema acontece quando essas expectativas desrespeitam a personalidade e sonhos do outro, de modo que a pessoa espera ver seus próprios desejos realizados na vida do familiar.
Isso acontece, por exemplo, quando Emily forçava Lorelai a participar dos eventos em que ela não se sentia à vontade e ficava frustrada pela personalidade da filha ser muito diferente do que ela esperava.
Sendo que isso dura até a vida adulta, como quando Emily quer forçar Lorelai a ficar com Christopher mesmo quando ela já estava comprometida com Luke.
Mas o que não fica tão óbvio assim é que esse ciclo se repete até mesmo entre Lorelai e Rory. Por ter engravidado muito cedo, Lorelai acabou perdendo muitas oportunidades de se aprofundar nos estudos. Então, de certa forma, ela projeta isso em Rory.
Por mais que desde cedo Rory realmente gostasse de estudar, nós vemos que algumas vezes Lorelai impõe certas situações para ela, como quando ela se frustrou muito por Rory ter começado a pensar em trocar Harvard por Yale.
Além disso, o desejo de Lorelai de ver Rory ser totalmente diferente de Emily e Richard fez com que ela muitas vezes impusesse à filha uma distância desse mundo, mesmo que às vezes isso não fosse necessário.
Como quando Lorelai não quer que Rory vá ao clube com seu avó para aprender a jogar golfe.
A dificuldade em saber lidar com críticas
Se existe um fato sobre Rory Gilmore é que ela não sabe lidar com críticas.
Sendo muito querida por todos da cidade, Rory sempre foi um exemplo de perfeição. Era amável, inteligente e simpática, de forma que quase nunca precisava entrar em conflitos.
Porém, quando isso começou a acontecer com mais frequência, as reações dela não foram nem um pouco boas.
Quando Lorelai a repreende por ela ter tido um caso com Dean, que estava casado, ela age como se não tivesse feito nada de errado, colocando a culpa até mesmo em Lindsay.
E, depois, ela ainda foge da situação indo viajar para a Europa com sua avó, evitando contato com a mãe, como se fosse a vítima. É claro que Dean tinha mais responsabilidade, afinal era ele quem estava em um relacionamento, mas isso não tira a culpa de Rory também. Inclusive, iremos nos aprofundar nisso depois!
Depois, quando Mitchum Huntzberger diz que ela não tinha talento para ser jornalista, seu primeiro ímpeto é roubar um barco, ir presa por isso e depois largar Yale.
Ou seja, Rory tinha grande dificuldade com qualquer situação em que alguém enfrentava suas escolhas e fazia alguma crítica, dificilmente aceitando o que a pessoa dizia.
Umas das poucas vezes em que isso acontece é quando Jess reaparece em sua vida e faz com que ela caia na real.
A impulsividade em lidar com os problemas
Se Rory roubou um barco, as outras garotas Gilmore também tiveram atitudes bem impulsivas. E, ao longo da série, podemos ver que as três têm essa dificuldade em lidar com sentimentos e emoções.
Quando Rory e Lorelai brigam por ela ter deixado Yale, Lorelai fica muito abalada. E, sentindo saudade da filha e preocupada com o rumo das coisas, ela faz o que ninguém esperava: pediu Luke em casamento.
Por mais que os dois sejam perfeitos um para o outro e ending game, ficou muito claro que ela ainda não estava preparada para se casar e estava fazendo aquilo apenas para suprir uma falta.
O que nos leva a outra atitude impulsiva, quando ela e Luke brigam, Lorelai acaba dormindo com Christopher, o que revela novamente o modo como, muitas vezes, ela lida com seus sentimentos do jeito errado.
Emily, por outro lado, quase comprou um jatinho simplesmente porque estava triste por ter brigado com Rory. Além de diversas vezes ter dificuldade em ser vulnerável e acabar tomando atitudes impulsivas e nada assertivas com a família.
O polêmico Revival
Gilmore Girls — Um ano para recordar trabalhou muito a ideia de humanidade das personagens, mostrando que mesmo pessoas incríveis podem acabar não tendo o futuro que esperavam.
Rory é uma mulher com um futuro incerto e sem uma carreira de prestígio. Sua vida amorosa está um caos: ela tem um caso com Logan enquanto ele está noivo e ela tem um namorado.
Aqui vemos uma quebra da menina perfeita e exemplo de Stars Hollow. A ideia de que ela era boa demais e o centro do mundo é quebrada, mostrando que ela é apenas uma pessoa comum fadada a erros.
Além de também evidenciar o padrão de comportamento de Rory de sempre achar que pode ter o que quer, sem se importar com os sentimentos dos outros. Como quando ela beijou Jess enquanto estava com Dean, ficou com Dean mesmo ele estando casado e depois beijou Jess enquanto estava com Logan.
Assim, a série consegue dar um choque de realidade no telespectador, revelando que “ninguém é tão bom assim”.
Contudo, é inevitável que a gente se sinta frustrado. Afinal, não só Rory, mas quase todas as mulheres brilhantes se encontram em situações ruins no Revival.
Como Paris, que tem um futuro parecido com o de seus pais: bem-sucedida com sua clínica de fertilidade, porém com o casamento em crise e com filhos que gostam mais da babá do que dela.
Além disso, temos a maior polêmica de todas: a gravidez de Rory. Nesse ponto, a série coloca em Rory quase o mesmo destino de Lorelai, principalmente se o pai for Logan, já que ele aparece como uma versão mais nova de Christopher.
Ou seja, é como se, apesar de tudo, Rory estivesse fadada a reptir o ciclo de Lorelai, ainda que em uma situação uma pouco melhor.
O que podemos aprender com Gilmore Girls?
E com essa confusão toda podemos aprender algo? Claro que sim! Afinal, a psicologia em Gilmore Girls não poderia deixar de lado o modo como muitas vezes nós nos vemos nas personagens e nos inspiramos nelas.
“O que Lorelai Gilmore faria nessa situação?”.
A vida real nem sempre acontece como planejamos…
Por mais que Rory tivesse sua vida toda planejada, fizesse mil anotações e ponderasse tudo, muita coisa aconteceu ao contrário do que ela esperava.
Foi para Yale ao invés de Harvard, não foi trabalhar no The New York Times e acabou ficando grávida.
E toda essa trajetória nos mostra que por mais que a gente faça planos, a vida acontece e as coisas mudam.
…por isso a resiliência é essencial
Afinal, se a gente já cria essa consciência de que nem sempre as coisas vão sair como esperado, conseguimos aceitar com mais facilidade e lidar melhor com a situação quando algo foge do nosso controle.
O modo como reagimos ao que nos acontece importa mais do que o acontecimento em si.
Por exemplo, Rory saiu de Yale, mas depois teve resiliência o suficiente para voltar, e quando sua carreira desandou, ela teve coragem de escrever um livro sobre a própria história.
E Lorelai, que enfrentou situações difíceis quando ficou grávida, mas conseguiu criar um lar seguro para ela e para Rory. Além de também ter sido muito resiliente quando a pousada pegou fogo e ter tido forças para se graduar na faculdade enquanto trabalhava e cuidava de Rory.
Sem contar Emily, que passou por um processo de luto muito difícil, mas ainda conseguiu ressignificar essa dor e dar sentido para essa nova fase da sua vida, abrindo mão de tudo que conhecia e começando uma nova vida.
Somos família, mas também seres individuais
Em Gilmore Girls aprendemos que ser família não é ser igual, mas sim conviver com o outro sendo quem você é.
Os laços familiares são muito importantes e devem ser cultivados com amor e respeito, dando liberdade para que todos sejam exatamente quem são, mas ao mesmo tempo aconselhando e também recebendo conselhos.
Além disso, também aprendemos sobre a importância de impor limites, saber ouvir e fazer do nosso lar um lugar de aconchego e amor!
Tem mais análises psicológicas de séries para ver
Se você gostou de ver a psicologia em Gilmore Girls, deixe aqui nos comentários a sua opinião sobre a série!
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2 replies on “A psicologia em Gilmore Girls: café, amor e muitos problemas”
Amei o post! Sempre me identifiquei muito com a Rory, especialmente minha infância e adolescência. Eu olho pra trás e sinto como se tudo, inclusive eu, fosse quase perfeito. Principalmente a visão que eu tinha e tenho de quem eu era aos meus próprios olhos, e das outras pessoas também. Não tomei escolhas impulsivas como as de Rory, que na série são extremamente decepcionantes, especialmente após dormir com o Dean casado, mas no que tange amar estudar, ler, ser obediente e organizada, pontual, empática, respeitada e amada por todos, eu me identifico 100% quando lembro da minha infância e adolescência.
Eu odeio o revival com todas as minhas forças pois detestei o destino de todas as personagens e estou convencida de que quem escreveu esse roteiro estava em profunda depressao e decepção com a vida quando o fez… mas a pior sensação que a série me traz é a sensação do esforço não recompensado. Rory é o exemplo perfeito disso. Ela não era apenas uma garota sonhadora, mas ela se esforçava na mesma medida e até uma medida a mais que os seus sonhos demandariam dela. Suas atitudes impulsivas e dificuldade de lidar com críticas são seus defeitos, mas isso não anula seus muitos e muitos anos de esforços não recompensados.
Quando entrei pra vida adulta aos 18 anos me senti atropelada pela vida… tendo que trabalhar pra bancar meus estudos na faculdade, um vida profissional e acadêmica muito aquém do que eu idealizava pra mim tendo em vista meu “brilhantismo” criança e adolescente. Eu me frustro muitas vezes pensando em um dia chegar ao ponto de tudo se tão bom quanto costumava ser antes dos meus 18 anos. Mas o que eu mais sinto falta é ter a confiança que eu tinha. Eu amava quem eu era, tinha muito orgulho de ser quem eu era, e era 100% segura, e muitas e muitas vezes me pego sonhando em voltar um dia a me sentir sobre eu mesma como eu costumava me sentir.
O ruim de ser “Rory” é um sentimento de que tudo era tão perfeito, e as coisas podem não voltar a ser tão boas quanto eram… é olhar pra trás e ver a sua primeira versão como a sua melhor , mesmo vinte anos depois.
Se construir/reerguer como Lorelai fez, depois de uma infância e adolescência rebelde e viver uma vida condizente com as escolhas dela eu vejo como algo infinitamente mais fácil, pois qualquer nível de evolução e amadurecimento já é progresso. Mas pra quem começou tendo tudo, e aos poucos foi sendo desconstruída, a vida pode ser um constante sentimento de esforço mal recompensado.
O desafio que eu vejo para as Rorys por aí (que se identificam com a fase Mary e Rory antes de quebrar o casamento do Dean), é encontrar novas versões de si mesma das quais você se orgulhe e ame tanto quanto as primeiras versões. Eu sei que eu estou vivendo esse desafio em minha vida adulta, profissional, acadêmica, matrimonial e maternal.
E meu sonho é um dia chegar ao ponto de amar cada versão de mim, reconhecendo e apreciando o meu crescimento pessoal em cada fase da minha vida mesmo quando nada aconteceu como eu imaginava… e que todos e cada um dos meus esforços sejam recompensados. É o meu desejo para todas as Rorys por aí também, especialmente a personagem.
Ei, Carol!
Sim, realmente é muito triste ver o que acontece com a Rory no Revival. E também é bem ruim ver que a mesma coisa aconteceu com várias mulheres na série, como a Lane que acabou sendo mãe super cedo e se frustrando bastante depois do casamento com o Zach. E a Paris, que acabou tendo um futuro muito parecido com o da própria mãe.
Todas eram incríveis e acabaram não tendo um futuro bem legal.
Espero te encontrar mais vezes por aqui,
Abraços,
Gabi da Equipe Eurekka <3