Conversas difíceis: como falar a verdade sem magoar

henrique souza fundador da eurekka

Henrique Souza

Neste texto, vamos abordar um tema muito interessante: como ter conversas difíceis sem criar mágoas. Afinal, para chegar a qualquer lugar na vida, em algum momento, a gente vai ter que falar coisas difíceis.

Por isso, vamos explicar para você o que não fazer em situações difíceis e, além disso, vamos dar quatro dicas para discutir sem magoar ninguém. Boa leitura!

O que quer dizer falar coisas difíceis?

Imagine que alguém magoou você e você precisa dizer de forma bem sincera como você está se sentindo. Isso é ter conversas difíceis! Essa conversa não é fácil porque você precisa dizer a ela o que foi que magoou você e que não está gostando da situação.

Você vai concordar comigo que a maioria das pessoas foge deste tipo de conversa, não é mesmo? Acontece que temos um problema aí: essa conversa não vai existir? Então, os ressentimentos vão permanecer? As coisas não serão esclarecidas?

Bom, a verdade é que não dá pra garantir que não haverá nenhuma mágoa e a outra pessoa pode sim ficar meio chateada, mas é necessário comunicar o que sentimos. Diante disso, o que a gente tem que aprender é como ter uma conversa difícil deixando o mínimo possível de marcas negativas.

Eu preciso ter conversas difíceis?

Vamos começar perguntando o seguinte: eu preciso mesmo ter conversas difíceis? Tem como viver sem isso? Se você já teve uma conversa difícil com alguém, você sabe que não é uma situação muito prazerosa.

Imagine que um familiar seu comece a fazer uma piada sobre você e você não goste. Seu parente mencionou alguma coisa sobre o seu peso ou sobre a roupa que você está vestindo. Isso foi muito incômodo, então você o chamou para uma conversa. 

É claro que este não foi um momento confortável, pois você ficou nervoso e não gostaria de passar por isso. Acontece que essa conversa foi necessária, porque há como viver sem ter conversas difíceis, mas não há como viver bem.

conversas difíceis

Riscos de evitar conversas difíceis

Há dois fenômenos que ocorrem quando você se recusa a ter essas conversas difíceis com as pessoas. A pessoa retraída, por exemplo, vai guardar o que a incomodou. Ou seja, não vai falar, porque ela tem medo de conflitos. É capaz, inclusive, de segurar a mágoa pelo resto da vida e nunca ter uma conversa difícil.

Muitas crianças e adolescentes ouvem os amiguinhos dizendo coisas agressivas e debochando, mas não têm coragem de tirar satisfação. Essas pessoas ficam chateadas, fecham a cara e carregam a mágoa, muitas vezes, pra sempre. Então, um dos jeitos de você lidar quando alguém faz algo de que você não gosta ou com que não concorda é você se retrair, ficar magoado.

Quando a sua única estratégia de resolver uma mágoa é fugir de uma conversa difícil, você acaba ficando ressentido, e o pior, alimenta este ressentimento, porque não foi resolvido, você não comunicou à outra pessoa o seu incômodo.

O que é o ressentimento? 

Ressentimento é a sensação de que o mundo é injusto, de que as pessoas são injustas com você o tempo todo. Quando a gente começa a se transformar numa pessoa que não consegue falar coisas difíceis ou impor limites, a gente vai se transformando nessa pessoa ressentida. Então, o ressentimento vai apodrecendo e vai se tornando um desejo de vingança.

O desejo de vingança vai se tornando um plano de vingança. E, enfim, você vai pelo caminho da violência. Então, é muito perigoso.

Então, o outro caminho não é menos pior; é o caminho da explosão de raiva. Você pode até se identificar com aquela pessoa que guarda tudo por muito tempo, e às vezes, explode. Então, aquela pessoa irrita você até o limite… Daí você briga com ela, grita, xinga e diz o que não devia ser dito. 

O problema é que, quando você tem uma explosão de raiva, o assunto não se resolve por mágica. Na verdade, o assunto só se aquieta por um tempo. É o que acontece, por exemplo, quando brigamos com uma criança.

Gritar não resolve o problema – nem ficar quieto

Você diz para o seu filho que ele não pode comer biscoito antes da janta. Ele pega o biscoito mesmo assim. Você fala uma, duas, três vezes. Na quinta vez, você ou seu cônjuge explode de raiva. A criança para de pegar o biscoito por alguns dias. E, depois, ela vai repetir aquele comportamento.

Então, ou você pode ser uma pessoa ressentida, ou você pode ser uma pessoa que acaba explodindo de raiva a cada  período de tempo, quando a sua paciência chega ao fim. Felizmente, essas não são as duas únicas opções. Existe uma terceira opção que  a gente quer trazer para vocês.

O que priorizar na hora de conversas difíceis

Uma das preocupações que você deve ter é ter conversas difíceis de um jeito que a pessoa entenda. E, segundo, falar coisas difíceis de um jeito que a pessoa mude.

Não adianta você ser o tipo de pessoa que reclama horrores e nada acontece. Assim como não adianta ser o tipo de pessoa que não reclama e o outro não muda. Então, como é que eu faço pra falar coisas difíceis sem magoar? 

A primeira coisa que você tem que entender é o seguinte: tem como falar sem magoar, mas existe uma diferença entre magoar e machucar.

Você não consegue evitar a mágoa

Não tem como evitar a dor, porque ela faz parte da vida. Por exemplo, quando o gestor fala para o entrevistado que ele não foi aprovado na seleção de emprego, porque ele não preencheu todos os requisitos de que a empresa precisava, o candidato vai ficar um pouco machucado. Afinal, ele tinha planos a partir deste emprego e essa comunicação vai quebrar as suas expectativas.

O importante é falar de um jeito que não magoe. Imagine o gestor dizendo para este mesmo candidato que ele é incompetente e que a sua entrevista em inglês foi vergonhosa! Ele vai ficar muito magoado com essa comunicação e vai gerar ressentimento. Então, isso é desnecessário e não faz bem pra ninguém.

Então, pra ficar bem claro, é quase impossível ter uma conversa difícil sem chatear o outro e provocar algum incômodo. No entanto, a gente precisa tomar cuidado para não magoar.

O que é magoar? É criar ressentimento no outro. Então, quando você tiver uma conversa difícil com alguém,  pense que ela é um ser igual a você, para quem você quer sempre o melhor e que, se você gerar ressentimento, essa pessoa terá o desejo de se vingar. Isso não é bom!

O que não fazer em conversas difíceis

Há três atitudes que você não deve ter quando for fazer uma crítica negativa a alguém ou ter uma conversa difícil.

conversas difíceis em local público não dão certo

1. Escolher um lugar público

Uma conversa difícil nunca deve ocorrer em público. Isso é importante porque a pessoa com quem você vai conversar tentará se defender para proteger sua própria reputação. Dessa forma, a conversa não flui, porque ela não está aberta para ouvir.

Uma forma eficiente de imaginar tudo isso é se perguntando: se fosse com você, como você gostaria de receber uma crítica negativa? 

2. Falar sem pensar

Quando você estiver falando a sua crítica ou expondo seu pensamento, nunca fale da personalidade da pessoa, portanto, foque no tema da sua conversa. 

Então, digamos que uma pessoa tenha sido grossa com você. Há três jeitos dessa situação se desenrolar: o primeiro jeito seria relevar e deixar pra lá; o segundo, seria você dizer a ela “deixa eu refletir sobre o que aconteceu, eu não entendi direito o que você quis dizer. Me senti um pouco atacado”. E o terceiro seria você atacar a personalidade da pessoa dizendo a ela que ela é grossa o tempo inteiro.

A personalidade são as nossas tendências de comportamento. Quando se diz que alguém é tímido, está se falando da personalidade da pessoa. Ou seja, ela tem uma tendência a se comportar de maneira tímida diante de algumas situações.

Então, neste caso, quando você tiver que fazer uma crítica a esta pessoa, procure não focar na timidez dela, mas no fato ocorrido. Sabe por quê? Porque quando alguém aponta os seus defeitos, é comum que fiquemos na defensiva.

Imagine a seguinte situação: numa palestra, depois de falar por 30 minutos, ouço de alguém da plateia o seguinte comentário “Henrique, durante um determinado momento da palestra, eu me senti ofendido quando você tocou naquele assunto”. Agora, outra pessoa faz a mesma crítica de outra forma e diz “Henrique, por que você foi tão grosseiro ao longo da palestra inteira?”

Você percebeu a diferença? Quando a pessoa fala assim, eu vou pensar “Não é verdade que eu fui grosseiro a palestra inteira, por causa disso e daquilo”. Se eu ataco a personalidade, a pessoa produz justificativas. Por fim, quando eu falo de um ponto específico, a pessoa reflete e entende o que você quer.

3. Tentar adivinhar a intenção da pessoa

A terceira atitude que você nunca deve ter é falar da intenção da pessoa. Por exemplo, alguém está tomando um café. Você sabe qual foi a intenção dela ao resolver tomar um café? Você pode ter alguns chutes e até dizer “a intenção dela tomando café foi ficar mais energizado”. “A intenção foi ter alguma coisa quente na boca”. Mas você não pode afirmar com total certeza, não é mesmo?

Isso significa que quando a gente tenta ler a intenção dos outros, a nossa leitura nunca é precisa. Então, às vezes, a gente vai fazer uma crítica e fica falando da intenção que a pessoa teve, sem ter certeza que foi aquela intenção.

Quem nunca pensou “eu achei ridículo essa atitude, porque claro que isso só para me incomodar, para jogar na minha cara”. Pode até ser verdade que a pessoa fez aquilo para magoar você e jogar na sua cara.

Contudo, é raro que as pessoas admitam que elas tinham uma intenção ruim, pois a gente não gosta de parecer malvado. Então, na hora, você vai fechar a porta do real diálogo e a pessoa nunca vai admitir que ela fez aquilo por mal. 

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4 dicas para ter conversas difíceis sem magoar as pessoas

Vamos falar, então, das quatro atitudes que você deve ter para ter discussões saudáveis:

1. Lembre que você já esteve lá

A primeira é uma atitude ligada a você. Procure lembrar quantas vezes você falou alguma bobagem e procure se colocar no lugar da outra pessoa. Então, você pode, por exemplo, criticar o egoísmo de alguém, mas nunca antes de perceber o quanto você também já foi egoísta. A empatia é muito importante!

Uma coisa que ajuda muito a gente a acertar o tom de uma crítica é sempre lembrar que você já esteve naquela mesma situação ou parecida. Então, se você quer criticar alguém que mentiu para a  própria mãe, por exemplo, você pode nunca ter mentido para sua mãe, mas já escondeu uma informação importante dela. Você já teve essa maldade dentro de você.

2. Introduza a conversa

Você deve estar pensando “Como eu começo essa conversa difícil?” A gente explica!

Vamos começar explicando que a conversa precisa de uma introdução. No geral, a gente fala pro outro o objetivo daquela conversa. É como se você passasse o trailer antes de passar o filme. Certo?

Você fica magoado com um comentário que um amigo seu fez em público. No entanto, você não quer chamar a atenção dele ali, naquele momento, para não gerar uma situação de conflito. Então, você, em outro momento, chama seu amigo e comunica a ele a atitude que machucou você. Uma sugestão: ”cara, te chamei para conversar, porque eu queria ajustar algumas coisas sobre a nossa amizade. E queria te falar sobre um negócio que me machucou, mas que eu acho que você não fez por mal.”

Essa moldura é muito importante. Por quê? Porque a moldura impede que a pessoa entre na defensiva na hora. Se você não faz nenhuma moldura, a pessoa vai, com certeza, se defender.

Agora, se alguém falar “eu quero ter uma conversa com você e eu sei que você não fez isso por mal”, a gente tem uma introdução à conversa.

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3. Comece com a palavra “eu”

A terceira dica é que você comece as frases com a palavra eu. O segredo é que a maioria das nossas conversas difíceis que dão errado começam sempre com a palavra você ou tu, como usamos mais aqui no Sul.

“Você não sabe me tratar bem”

“Tu só reclama e não faz nada de útil.”

“Você fica me julgando e me incomodando.”

Quando a gente começa as frases com a palavra tu, acontece o de sempre: a pessoa levanta a sua guarda, fica na defensiva e não vai aceitar aquela crítica. Ela vai receber aquele ataque e vai querer atacar de volta. 

Então, lá vamos nós com mais um exemplo. Você pode dizer “Joana, queria conversar sobre um comentário que você fez. E eu acho que você não fez o comentário por mal, mas eu queria que você entendesse como eu me senti com esse comentário. Talvez outras pessoas se sintam assim também. Quando você comentou tal coisa, eu fiquei com a impressão de que você não estava compreendendo o que estamos passando. Eu me senti atacado, e eu acho que você não quis me atacar. Mas, como você falou daquele jeito, eu me senti atacado. É isso que tem acontecido.” 

Você pode usar as expressões “eu senti, eu tive a impressão, me pareceu, eu pensei”…  Assim, não tem como a pessoa dizer “não, você não ficou com impressão”. Afinal, eu estou afirmando uma coisa sobre mim.

Agora, quando eu digo que o outro fez isso por mal, já abre espaço para conflito. Então, a gente tem que começar as conversas com eu. Isso facilita muito, pois quanto menos a gente faz a pessoa se sentir atacada na sua personalidade, mais aberta ela está para discutir.

Mas a pessoa não tem que aceitar o meu jeito?

Há um nível de maturidade em que você pode receber a crítica mais agressiva e, mesmo assim, tentar tirar alguma coisa daquela crítica. Este é o nível de maturidade emocional perfeito, mas a realidade é diferente, então vamos lidar com ela. Ninguém aqui é santo e tem sangue de barata, não é mesmo?

A gente está lidando com pessoas que têm problemas, assim como nós temos. Umas têm falta de humildade, outras são muito orgulhosas. Então, a gente tem que lidar com as pessoas como elas são.

casal tendo uma briga
casal tendo uma briga

4. Quando X, eu Y

Para finalizar, a última dica é um derivado desta terceira dica. Durante uma conversa difícil, use a fórmula “quando X, eu Y”. O “X” é a situação ou atitude e o “Y” é como você se sentiu. Então, a fórmula é: quando aconteceu essa situação ou atitude, eu me senti de tal forma.

Digamos que você esteja numa conversa e queira comunicar uma crítica negativa à outra pessoa: “Olha, quando você fez aquele comentário na minha foto, eu me senti exposta.” Ou seja, quando tal coisa aconteceu, eu senti tal coisa.

Então, logo depois, você fala “eu acho que não foi sua intenção, mas eu me senti assim e não queria que isso acontecesse de novo para o bem da nossa amizade.” Quando você fala da situação e depois você fala “eu”, você usa o poder de usar a palavra “eu” para poder descrever o que sentiu, sem acusar o outro.

Descrever é diferente de julgar

Esta técnica consiste em você primeiro descrever a situação e depois falar como você se sentiu. Por isso, é importante saber a diferença entre descrever e avaliar ou descrever e julgar.

Por exemplo, como posso descrever uma xícara? Eu falo os fatos sobre aquela xícara. Então, eu digo que a xícara que estou usando agora tem dez centímetros de altura, mais ou menos; ela é branca e está com café dentro. Ela tem uma marca de café no cantinho, é redonda na base e tem uma alça.

Agora, se você me pedir para avaliar ou julgar essa xícara, vou dizer que ela é bonita, mas ela está velha. Eu queria que ela estivesse com mais café dentro.

Viu só? Existe uma diferença enorme entre você falar os fatos sobre essa xícara e você julgá-la. Entendeu? Agora, muitas vezes, quando a gente vai descrever uma situação, a gente acaba julgando em vez de descrever.

Agora você já tem todas as dicas de que precisa para ter conversas difíceis sem magoar ninguém. Gostou? 

Então, me conta nos comentários se você já brigou por magoar alguém ou alguém magoou você na hora de ter conversas difíceis!

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Henrique Souza

Henrique é psicólogo pela UFRGS, atuando na clínica com a Abordagem Analítico-Comportamental, apaixonado por criatividade e comunicação e co-fundador da Eurekka, a startup de Psicologia que se tornou a maior rede de psicoterapia do Brasil. Além de fazer mais de 5000 sessões por mês, a Eurekka também oferece telemedicina, franquia para Psicólogos e outros produtos tanto para quem busca mais saúde e uma vida com propósito, quanto para psicólogos querem alavancar sua carreira.

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