Análise psicológica do filme Fragmentado: TDI e caso real

Equipe Eurekka

Um filme dirigido pelo grande mestre do suspense, M. Night Shyamalan, que aborda um dos grandes mistérios da mente humana. Por isso, hoje trouxemos para você uma análise psicológica do filme Fragmentado

A obra é a segunda de uma trilogia, a primeira é Corpo Fechado e a terceira é Vidro, sendo que, apesar de terem histórias próprias, as três se passam no mesmo universo e se interligam entre si.

E, por aqui, você irá entender melhor o que acontece em Fragmentado a partir do olhar da Psicologia, a qual se mostra presente em todo o filme e na própria construção do roteiro.

Boa leitura!

Sinopse de Fragmentado

Kevin Wendell é um homem solitário que trabalha na mesma empresa há dez anos. Ele nunca causou nenhum problema e passa despercebido pela maioria das pessoas.

Porém, há um detalhe que muda tudo. Kevin tem 23 personalidades muito distintas e que variam entre si, de modo que cada uma assume o controle do corpo em ocasiões específicas.

E, certo dia, uma dessas personalidades sequestra três meninas que estavam saindo de um aniversário. Assim, quando Claire, Marcia e Casey acordam, elas estão presas no porão de Kevin.

Dessa forma, elas irão ficar cara a cara com essas múltiplas personalidades e terão que aprender a lidar com cada uma delas, de forma a achar um modo de escapar do cativeiro e sobreviver. 

Análise psicológica do filme Fragmentado

Agora, vamos nos aprofundar em partes específicas da história para fazer a análise psicológica do filme Fragmentado.

Confira!

TDI: o transtorno dissociativo de identidade de Kevin

Como falamos acima, o protagonista Kevin tinha 23 personalidades, sendo que cada uma delas tinha características próprias.

Por exemplo:

  • Barry: o estilista que busca apoio psiquiátrico 
  • Hedwig: um garoto de 9 anos que tem a língua presa
  • Dennis: uma identidade sombria, foi ele quem sequestrou as meninas
  • Patrícia: uma mulher britânica cruel que manda nas outras identidades
  • Kevin: a personalidade original

E a verdade é que esse transtorno realmente existe e se chama Transtorno Dissociativo de Identidade (TDI).

Segundo o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5), o TDI é caracterizado por uma ruptura de identidade, de modo que a pessoa apresenta dois ou mais estados de personalidade diferentes.

Ocorrendo, assim, perda de memória — ocasionada por essa troca de identidades — sofrimento psicológico e prejuízo nas diversas áreas da vida. 

Além disso, a pessoa com TDI tem descontinuidade do senso de si mesma e do domínio das próprias ações, uma vez que as variações de identidade resultam nessa não linearidade de personalidade e comportamento.

Ou seja, tudo muda: o afeto, a memória, a consciência, a percepção, a cognição e até mesmo o funcionamento sensório-motor.

Contudo, é importante ressaltar que o TDI é um transtorno muito raro, existindo pouquíssimos casos clínicos documentados. 

E no modo como acontece em Fragmentado, é mais raro ainda. Isso porque a troca de identidade de forma rápida e brusca, assim como em Kevin, é muito difícil de acontecer.

No geral, são mudanças sutis e que demandam trabalho especializado para perceber.

E também é importante lembrar que no filme ocorrem exageros, sendo que a pessoa ter TDI não significa que ela será agressiva e/ou manipuladora.

É necessário separar o mundo cinéfilo da realidade, a fim de não perpetuar preconceitos a respeito dos transtornos mentais e das pessoas que sofrem com essa condição.

Anya Taylor-Joy em fragmentado

Traumas por todos os lados

O filme também aborda muito a questão dos traumas psicológicos e os impactos que essas situações traumáticas têm na saúde mental. 

O protagonista, Kevin, sofreu muitos traumas na infância, principalmente quando seu pai morreu e ele ficou sozinho com a mãe alcoólatra que cometia diversos abusos

E isso condiz muito com a realidade do transtorno, pois, segundo o DSM-5, o transtorno dissociativo de identidade está relacionado a experiências devastadoras, eventos traumáticos e/ou abuso ocorrido na infância.

Além disso, também acompanhamos um pouco da história de Casey, uma das meninas que foi sequestrada. 

O filme nos mostra que ela sofria abusos sexuais do tio nas viagens de caça que fazia com ele e com o pai dela. E tudo fica pior ainda quando seu pai morre e sua guarda passa para o tio.

Essa é, inclusive, uma das razões de Casey se mostrar tão diferente das outras, como se já conhecesse o horror.

E o final do filme nos mostra algo mais devastador ainda. Quando Casey sai do cativeiro, quem vai buscá-la é o tio. Então, ela foge de um monstro para outro.

Nessa cena, o telespectador percebe que não havia escapatória. O terror não acabaria porque ela conseguiu sobreviver às personalidades de Kevin, mas continuaria, mesmo voltando para casa.

O tratamento psicológico

No filme, temos a figura da psiquiatra que atende Kevin, ou melhor, Barry. 

A Dr.Fletcher é doce e amável, sendo por isso que Barry cria uma relação de confiança com ela. Até aí tudo certo, afinal o papel do profissional da saúde mental é realmente acolher e fazer com que o paciente se sinta seguro para falar sobre si.

O problema acontece quando ela começa a se entusiasmar por estar em contato com esse caso clínico, antes inédito em sua carreira. Assim, ela deixa de tratar devidamente o caso e começa a enxergar Kevin como alguém que tinha uma capacidade especial.

Assim, ele acaba não recebendo a ajuda necessária, apesar dos alertas que ele mesmo dava.

Por isso, é importante sempre lembrar que o TDI não se trata de uma habilidade, mas de um transtorno real que causa muito sofrimento para a pessoa em si e para os outros ao seu redor.

Além disso, outro ponto importante para se levar em conta é que, apesar de no filme Kevin terminar como um caso sem remissão, a verdade é que o TDI pode sim ser tratado, de forma que a pessoa viva uma vida plena e com os sintomas controlados.

E, mais a frente, você verá um caso real disso!

A metáfora da personalidade fragmentada

Como falamos alguns tópicos acima, o desenvolvimento do TDI está ligado a eventos muito traumáticos, de forma que, para se proteger de alguma situação e também dissociar de algo que gera dor, a pessoa “se fragmenta” em diversas identidades.

Ou seja, essas identidades com personalidades novas são criadas de modo inconsciente, como uma forma de autodefesa de situações ruins.

E o filme aborda isso muito bem! Por exemplo, por conta da ira e dos abusos da mãe, surge a personalidade de Dennis, o qual mantinha tudo limpo e organizado na tentativa de proteger Kevin dos surtos de raiva e dos diversos abusos.

Saiba mais: o TDI e as diversas personalidades do Cavaleiro da Lua

Billy Milligan transtorno dissociativo de identidade

Fragmentado é real? O caso de Billy Milligan

Não poderíamos fazer uma análise psicológica do filme Fragmentado sem falar dessa história real envolvendo o TDI.

Na década de 70 aconteceu um caso que, hoje, muitas pessoas vêem semelhanças com o filme Fragmentado. 

O que aconteceu foi que Billy Milligan foi a primeira pessoa a ser julgada e declarada inocente por conta do diagnóstico de transtorno dissociativo de identidade.

Quando tinha 22 anos, ele foi acusado de quatro estupros, três sequestros e três roubos. Porém, os médicos da defesa alegaram que ele teria TDI, sendo as personalidades desenvolvidas após anos de traumas e abusos físicos e sexuais na infância.

E eles não estavam errados. Após muitas avaliações médicas foi descoberto que o pai de Billy se suicidou quando ele era muito novo, depois de já ter tentado suicídio duas vezes, e esses teriam sido os primeiro eventos traumáticos de Billy.

Depois, se descobriu que, após a morte do pai, a mãe de Billy se casou de novo com Chalmer. Padrasto que estuprou Milligan no celeiro ao lado da casa, além de também ter cometido contra ele atos sodomitas e brutais.

E esses foram, segundo os relatos médicos, os traumas que levariam Billy a desenvolver o transtorno.

Assim, tendo ganhado a causa e provado a condição psiquiátrica de Billy, ele passou por vários hospitais psiquiátricos e ficou em tratamento por cerca de 11 anos, recebendo alta em 1988. 

Depois disso, ele foi paciente ambulatorial até 1991, quando recebeu alta definitiva. 

Por fim, ele foi para a Califórnia e depois voltou para Ohio, onde vivia uma “vida comum” e recebia tratamento mental de forma constante. 

Ele morreu em 2014, de câncer, em uma casa de apoio em Ohio. 

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